Na última quarta-feira (24), a Comissão Mista composta por deputados e senadores aprovou a medida provisória nº 1154/23, conhecida como MP da Esplanada, referente à organização básica dos órgãos da Presidência e dos ministérios do atual governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A proposta esvaziou a agenda ambiental com mudanças significativas nas pastas do Ministério do Meio Ambiente e Ministério dos Povos Indígenas. Além disso, a Câmara dos Deputados aprovou, por 324 a 131 votos, o requerimento de urgência do projeto de lei nº 490/07 que versa sobre o Marco Temporal.
Com uma sessão plenária ágil, com menos de 30 minutos, os parlamentares aprovaram a medida provisória que, entre outras mudanças, passou a gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) – que é utilizado para manter a base de cadastros de imóveis rurais e fazer o controle do desmatamento e conflitos em áreas de preservação – do Ministério do Meio ambiente para o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. A pasta perdeu ainda a Agência Nacional de Águas (ANA) que passou para o Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional.
Os parlamentares também trouxeram de volta alterações que afrouxam a proteção da Mata Atlântica. Entre outros pontos, o projeto permite o desmatamento da floresta, inclusive de áreas intocáveis, para obras de infraestrutura, bastando apenas a autorização das prefeituras e dispensando o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Embora, a Mata Atlântica seja um patrimônio nacional e o único bioma que tem uma lei especial que a rege.
A ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, Marina Silva, disse que “o Governo está vivendo as contradições de ser uma Governo de frente ampla”. Isso explicaria, em sua compreensão, o voto favorável de aliados do Planalto ao esvaziamento do Ministério.
O ministro Alexandre Padilha, responsável pela articulação política da Presidência da República em conversa com jornalistas, afirmou que “não há um esvaziamento da agenda de sustentabilidade no governo” e que, embora esse Governo respeite a relação e o papel que tem o Congresso Nacional, se necessário, irá vetar medidas no campo ambiental desfavoráveis aos compromissos assumidos com o povo brasileiro para governar.
O relatório do Deputado Isnaldo Bulhões Júnior aprovado pela Comissão Mista, também retira a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) e transfere a competência para a demarcação de terras indígenas da pasta do Ministério dos Povos Indígenas para o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Todo o trâmite, desde a origem da demarcação, continua com o Ministério dos Povos Indígenas, no entanto, a última fase do processo foi retirada, a da homologação. Em nota, o Ministério Público Federal reagiu, afirmando que essa atribuição “configura preocupante retrocesso jurídico na garantia e proteção dos direitos territoriais”, representando um verdadeiro “ataque às conquistas do movimento indígena!”
Para a imprensa. a ministra Sônia Guajajara lamentou a pressão da bancada ruralista no Congresso que, segundo ela, tenta enfraquecer as pautas do atual Governo com a MP. “Acho que da forma que ficou, apresenta e resgata esse comportamento tutelado sobre os povos indígenas, de não permitir que a gente decida, de não permitir que a gente participe desse rito da demarcação de terras indígenas.”
Marina Silva também corrobora com as palavras da Guajajara. “Estamos dizendo que os indígenas não têm isenção para fazer o que é melhor para eles mesmos em relação à demarcação de suas terras”, disse a ministra na quarta-feira (24), durante audiência na Comissão do Meio Ambiente da Câmara.
O indígena Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e outras lideranças estiveram na Câmara dos Deputados para acompanhar a sessão da Comissão Mista, mas foram impedidos de participar. Para Dinamam, “o Congresso quer inviabilizar as demarcações de terras indígenas. Isso é um grande retrocesso para os direitos dos povos originários e para a preservação do meio ambiente, visto que somos nós os verdadeiros guardiões dos biomas brasileiros.” “
A matéria ainda deverá tramitar no plenário da Câmara e do Senado, mas a decisão já desagrada ministros e provocou insatisfação de ambientalistas e lideranças indígenas.
PL 490/07 sobre Marco Temporal
Outra proposta aprovada no Plenário da Câmara dos Deputados em caráter de emergência nessa última quarta-feira (24), foi o projeto de lei 490/2007 sobre o Marco Temporal para demarcação de Terras Indígenas. Ao todo, foram 324 votos contra 131. O mérito do projeto deve ser votado na casa legislativa no dia 30 de maio.
Em uma rede social, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, se pronunciou sobre a decisão e considerou que “o Marco Temporal é um genocídio legislado”. Ela afirma ainda que o projeto de lei atenta contra a constituição brasileira. “Um atentado ao direito dos povos Indígenas. Um ataque a nossa maior possibilidade de enfrentamento da crise climática, as TI’s.”
O Marco Temporal é uma tese que pretende reinterpretar a Constituição, estabelecendo que os indígenas só têm direito a demarcação das terras que estivessem sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal do Brasil, ou que, nessa data, a terra estivesse em disputa física ou judicial comprovada.
O movimento indígena considera a fixação da data uma ameaça para a homologação de terras indígenas. Pois, até 1988 eram tutelados pelo Estado, então não poderiam lutar judicialmente por seus direitos e também não poderiam comprovar quando expulsos dos seus territórios ancestrais.
A aprovação do requerimento de urgência do Marco Temporal acontece às vésperas do julgamento do caso de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal, previsto para o dia 7 de junho. Para o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) em parecer técnico jurídico, “o PL 490/07 é inconstitucional até em sua forma, já que a Constituição Federal não pode ser modificada por meio de um projeto de lei.”
O projeto prevê sérias modificações que vão desde alterações no Estatuto do Índio à incorporação de medidas que estavam contidas na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/00. Além disso, permite que seja retirado dos povos indígenas o direito à consulta prévia, livre e informada sobre ações que impactam seus territórios. O que significa dizer que empreendimento predatórios serão flexibilizados como: áreas de exploração para garimpo, megaprojetos de hidrelétricas, estradas, etc.